Olha, desde dezembro de dois mil e oito eu estive ocupada em construir uma barreira enorme e impenetrável em que eu não deixaria ninguém sair e ninguém entrar. Expeli de mim todos os vermes, me deixei limpa e pura, e aí comecei a construir um muro lindo, impermeável, sem uma falha. Mas aí eu conheci você, e você era tão pequena pra mim que passou por uma fresta, ou destruiu com seu ácido o meu muro e quando eu vi você já morava em mim: construiu pouco a pouco os cômodos. Começou pelos gravetos, pregos, madeiras... suas farpas me faziam querer te colocar pra fora, mas aí você já estava na sala, no quarto, no sótão. Quando construiu e mobiliou tudo, deixando um caderno em cima da mesa para que eu escrevesse os planos, me deixastes ali, sentada, calma, quieta. Eu fiz a lista, escrevi com canela, com açúcar, com mel. Deixei em cima da mesa. Mas aí a folha ficou abandonada porque ninguém quis lê-la. Ela criou bolor, as formigas comeram algumas letras, o vento apagou alguns rabiscos. Ninguém leu, mas eu sabia o que havia escrito no meu papel manteiga.
Lembra que você tinha plantado um jardim? Você não cuidou... você chamou as ervas-daninha com a sua falta de cuidado. Você as convidou para entrar. Elas não fazem desfeita, sempre estão disposta a um belo manjar dos Deuses. Comeram folha por folha e ressecaram minhas orquídeas.
Depois veio o nosso castelo. Não era bem um castelo-de-princesa-com-duas-mil-bandeirinhas, mas eu gostava do nosso casebre. Com os ventos outonais algumas telhas voaram e a gente ficou meio sem chão. Aí a porta voou e você saiu por ela atrás de alguma coisa que eu não sei.
Na primavera eu descobri o que era a tal coisa. Coisa essa que me deixou um tanto amarga. Aquele ácido que você usou pra derrubar meus muros, eu guardei e aí ele resolveu passear pra fora de mim e voltar pra você. Nosso setembro foi um caos e eu chorei a sua morte antecipada. E você tentou se matar, se matando em mim. E eu morri ali.
Eu me mudei, você resolveu mudar. Eu vim para mais perto, mas já era tarde. Eu te amei do início, você resolveu amar a minha partida. Eu estive ocupada em construir o amor, você esteve ocupada em amar a felicidade. Eu estou ocupada em me reconstruir... você está ocupada em achar defeitos em mim. Eu gerei um sentimento por 8 meses, nós abortamos um mes antes de pari-lo.
Novamente dezembro chegou.
2 comentários:
"Eu te amei do início, você resolveu amar a minha partida. Eu estive ocupada em construir o amor, você esteve ocupada em amar a felicidade. Eu estou ocupada em me reconstruir... você está ocupada em achar defeitos em mim."
Já havia lido outros textos seus, mas nesse não posso deixar de comentar.
Você escreve maravilhosamente bem.
Tem aquele dom - que invejo - de conseguir colocar em palavras o que a maioria (inclusive eu) sufoca no coração.
Texto lindo, mesmo.
Beijos.
ps.: você havia construído um muro que foi violado; eu arquitetei uma casca que não tem uma rachadura.
Às vezes amo isso, às vezes odeio. [/curto desabafo à desconhecida]
Depois de perturbada pela Stutz por meia hora pra entrar no seu blog pelo ipod no wifi roubado de um café, quase chorei.
Não comentei na hora para conseguir ler depois tudo com calma, e conseguir pensar em algo bonito para dizer, especialmente porque estava com saudades de textos seus, mas acabou caindo no esquecimento e só me lembrei agora.
Toda vez que leio seus textos tenho vontade de te abraçar e dizer que tudo ficará bem, apenas plantar um jardim em volta do seu muro, nem ousaria entrar lá.
Feliz ano novo, minha querida. Muitas felicidades.
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